Distinção da relação jurídica nas operações de Securitização e Factoring

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21 de outubro de 2021

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O Tribunal de Justiça do Paraná, no julgamento da Apelação Cível n.0009202- 56.2015.8.16.0033, em 23.06.2021, da 16ª. Câmara Cível, Relator o Desembargador Paulo Cezar Bellio, bem definiu a distinção entre a relação jurídica contratual derivada da Securitização de Crédito para com aquelas derivadas de contrato de Factoring.

O julgado do TJPR detalha os efeitos desta distinção em face da responsabilidade do cedente em Contrato de Cessão de Crédito com Cláusula expressa de Garantia e Solvência pelo pagamento de títulos cedidos; valendo destacar do corpo do Acórdão:

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA ORIGINÁRIA DE INSTRUMENTO PARTICULAR DE CESSÃO DE CRÉDITO. RELAÇÃO JURÍDICA NO CASO CONSUBSTANCIADA EM SECURITIZAÇÃO DE CRÉDITO E NÃO FACTORING. CLÁUSULA EXPRESSA DE ARANTIA E SOLVÊNCIA PELO PAGAMENTO DOS TÍTULOS CEDIDOS. REGULARIDADE. EXCESSO DE EXECUÇÃO. NÃO COMPROVADO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE QUE A CESSIONÁRIA FOI BENEFICIÁRIO DO PAGAMENTO DE UM DOS TÍTULOS CEDIDOS NA OPERAÇÃO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS NO PERCENTUAL MÁXIMO DE 20%. IMPOSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃO EM SEDE RECURSAL.

“Cumpre enfatizar que embora existam semelhanças entre as operações de factoring e securitização, relativamente a aquisição de créditos com deságio, tem-se que possuem finalidades distintas.

Ao abordar acerca da Securitização de Recebíveis, José Alves Ribeiro Júnior destaca determinadas características da relação, consubstanciadas em cessão dos créditos previamente selecionados a uma sociedade de propósito específico (securitizadora), posterior emissão de valores mobiliários junto a investidores e o pagamento do preço de aquisição à cessionária, destacando-se os seguintes termos: (…) a securitização de recebíveis é uma operação em que, economicamente, ativos ilíquidos-recebíveis- são “transformados” em securities, isto é, em valores mobiliários,

destinados à livre circulação no mercado.”

(…)

KENDALL aborda a securitização de um modo mais simples, como um processo pelo qual empréstimos individuais e outros instrumentos de dívida são “empacotados”, posteriormente convertendo-se tais “pacotes” em um valor mobiliário ou em diversos valores mobiliários que são vendidos a terceiros. Por meio desse processo, os ativos subjacentes, ilíquidos, transformam-se em títulos líquidos negociáveis com terceiros investidores.

(…)

Em sua análise, entende que a securitização compreende três etapas negociais, a saber: (i) o “agrupamento” de créditos com características semelhantes e com histórico de pagamentos para viabilizar a análise de risco dessa carteira; (ii) a cessão desses créditos a uma sociedade de propósito específico (excluindo, em sua análise, a utilização do FIDC como veículo) e aemissão de valores mobiliários por esta; e (iii) o pagamento do preço de aquisição à cessionária. (RIBEIRO, José Alves Júnior. Securitização de Recebíveis Elementos Constitutivos no Direito Brasileiro, ed. 2020. E-Book).

Já no contrato de factoring, o faturizado (empresário) cede ao faturizador os créditos originários de suas atividades e este, além de administrar a carteira de devedores, assume o risco da insolvência dos títulos.

Acerca do tema, ensina Fabio Ulhoa Coelho:

“Quando a sociedade empresária concede crédito aos consumidores ou aos adquirentes de seus produtos ou serviços, passa a ter uma preocupação empresarial a mais: a administração da concessão do crédito, que compreende controle dos vencimentos, acompanhamento da flutuação das taxas de juros, contatos com os devedores inadimplentes, adoção de medidas assecuratórias do direito creditício etc. Além disso, o empresário, ao conceder crédito, assume o risco de insolvência do devedor. Claro que, em tese, a sociedade empresária não está obrigada a abrir crédito a quem procura seus produtos ou serviços. Contudo, a competição econômica, por vezes, não lhe dá outra alternativa. Se não criar facilidades de pagamento a consumidores ou adquirentes, a sociedade empresária pode perdê-los para os concorrentes.

O contrato de fomento mercantil – que pode ser referido também pela expressão faturização, proposta por Fábio Konder Comparato(1978) – tem a função econômica de poupar o empresário das preocupações empresariais decorrentes da outorga de prazos e facilidades para pagamento aos consumidores ou adquirentes.

Pelo contrato de fomento mercantil, um dos contratantes (faturizador) presta ao empresário (faturizado) o serviço de administração do crédito, garantindo o pagamento das faturas por este emitidas. A faturizadora assume, também, as seguintes obrigações: a) gerir os créditos do faturizado, procedendo ao controle dos vencimentos, providenciando os avisos e protestos assecuratórios do direito creditício, bem como cobrando os devedores das faturas; b)assumir os riscos do inadimplemento dos devedores; c) garantir o pagamento das faturas objeto de faturização. Há duas modalidades de fomento mercantil. De um lado, o conventional factoring, em que a faturizadora garante o pagamento das faturas antecipando o seu valor ao faturizado. Essa primeira modalidade compreende três elementos: serviços de administração do crédito, seguro e financiamento. De outro lado, o maturity factoring, no qual a faturizadora paga o valor das faturas ao faturizado apenas no vencimento, modalidade em que estão presentes a prestação de serviços de administração do crédito e o seguro, mas ausente o financiamento.”

(COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, ed. 19. E-Book).

Em observância ao Estatuto Social da apelada (mov. 1.3 dos autos principais de Execução de nº 0007030-44.2015.8.16.0033), nota-se que esta possui como objeto a securitização de crédito.

Ademais, verifica-se que restou expressamente prevista a atividade de securitização no ‘Instrumento Particular de Cessão de Créditos’, em ‘Considerações Preliminares

– item I’:

“I – A CESSIONÁRIA é companhia que pratica atividades de securitização, adquirindo direitos creditórios a fim de lastrear os valores mobiliários por ela emitidos, com o objetivo de adquirir os créditos da CEDENTE;”

Destarte, diante da caracterização da atividade de securitização, tem-se como válida a garantia prestada, consoante preconiza o art. 296 do Código Civil:

“Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor”.

Outrossim, tem-se que as partes pactuaram expressamente a responsabilidade solidária pela solvência dos créditos na ‘CLÁUSULA QUINTA’ do ‘Instrumento Particular de Cessão de Créditos’:

“CLÁUSULA QUINTA – Conforme convencionado entre as partes, a CEDENTE responde ainda, em conjunto com os RESPONSÁVEIS SOLIDÁRIOS, nos termos do artigo 264 e seguintes do Código Civil Brasileiro, pela solvência, liquidação, dos créditos cedidos, após o prazo 05 (cinco) da data de vencimento constante da face dos títulos ou documentos hábeis, bem como por todos os assessórios, custos, despesas com cobrança, referentes aos referidos créditos, sendo que o não pagamento pela CEDENTE e RESPONSÁVEIS SOLIDÁRIOS será considerado descumprimento contratual assumindo as penalidades previstas neste instrumento, sem prejuízo das sanções previstas na legislação vigente.”

Além do mais, não há qualquer comprovação por parte da apelante de que a operação não se perfectibilizou nos termos da securitização.

Nesse sentido, já decidiu essa egrégia Câmara Cível:

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA, COM EXTINÇÃO DO FEITO EXECUTÓRIO. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA EXIGIBILIDADE DE VALORES INDEVIDAMENTE RECEBIDOS. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE POR SENTENÇA EXTRA PETITA. NÃO ACOLHIMENTO. MATÉRIA QUE SE TRATA DE ORDEM PÚBLICA, EIS QUE INERENTE À ANÁLISE DA REGULAR CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. INSTRUMENTO PARTICULAR DE CESSÃO DE CRÉDITOS. NEGÓCIO JURÍDICO CELEBRADO ENTRE AS PARTES QUE SE CONFIGURA COMO CONTRATO DE SECURITIZAÇÃO E NÃO FACTORING CLÁUSULA DE GARANTIA DE SOLIDARIEDADE. ADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO REFORMADA. DEMAIS MATÉRIAS ARGUIDAS PELO EMBARGADO QUE PODEM SER ANALISADAS POR ESTE TRIBUNAL. ART. 1.013, §2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CAUSA MADURA. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO COSTATADA. LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE DOS TÍTULOS QUE EMBASAM A EXECUÇÃO. INSTRUMENTOS ASSINADOS PELAS PARTES E POR DUAS TESTEMUNHAS (ART. 784, III, DO CPC). LEGITIMIDADE PASSIVA CONFIGURADA. SÓCIO/EMBARGANTE QUE ASSINA NA QUALIDADE DE INTERVENIENTE SOLIDÁRIO. COMPROVAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO EM MORA. FIXAÇÃO DE VERBAS SUCUMBENCIAIS. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDO, COM A REFORMA DA SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO EXECUTÓRIO E, COM BASE NO ART. 1.013, § 2º, DO CPC, IMPROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS.

(TJPR – 16ª C.Cível – 0006853-48.2016.8.16.0194 – Curitiba – J. 08.07.2020).

Desta feita, em que pesem os argumentos da apelante, constata-se, no caso, que a relação originária se consubstanciou em operação de securitização e não de factoring.

Por conseguinte, não há falar em irregularidade na pactuação da cláusula de responsabilidade pela solvência dos títulos cedidos e consequente nulidade da nota promissória ora executada.”

Como visto, este julgado do TJPR serve de norte aos clientes e empresários do Fomento Comercial, distinguindo as peculiaridades da relação jurídica contratual operada pelas Securitizadoras de Crédito daquelas firmadas em contrato de

Factoring; especificando os efeitos desta distinção em face da responsabilidade do

cedente pelo pagamento de títulos cedidos em Contrato de Cessão de Crédito com Cláusula expressa de Garantia e Solvência.

SINFAC NEWS Jurandyr Souza Junior Advogado e Consultor Jurídico do SINFAC/PR e da ACREF-PR – escritório PENNACCHI SOUZA Sociedade de Advogados – OAB/PR.5952.

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