Cessão Fiduciária de Direito de Crédito

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8 de fevereiro de 2022

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A propriedade fiduciária foi inserida em nosso ordenamento jurídico como uma alternativa ao credor para se resguardar de eventual inadimplemento da obrigação. Não obstante a existência de instrumentos de garantia, tradicionalmente utilizados, como o penhor e a hipoteca, constatou-se que as suas características e condições se tornaram inoportunas na atualidade, tais como a necessidade de notificação do devedor para configurar a sua eficácia, e a sujeição dessas garantias ao procedimento recuperacional.

A propriedade fiduciária em garantia apresenta-se mais benéfica ao credor, posto que a coisa alienada ou cedida já não compõe o acervo patrimonial da empresa, e a propriedade, ainda que resolúvel, passa a ser exercida pelo credor fiduciário.

A propriedade fiduciária, ou, o direito de garantia, pode ser constituído sobre coisas

a) móveis infungíveis, b) móveis fungíveis, c) imóveis e, d) cessão sobre direitos creditórios.

O Código Civil de 2002, ao entrar em vigência derrogou o Decreto 911/1969, uma vez que passou a disciplinar a alienação fiduciária sobre coisa móvel infungível, nos seus artigos 1361 a 1368.

Para a constituição da propriedade fiduciária sobre coisa móvel infungível, deve-se observar a orientação contida no art. 1361 e §§1.º e 2.º do Código Civil.

Em relação à alienação fiduciária sobre coisa imóvel, deve-se observar o disposto na Lei Federal n.9.514/97, que dispõe sobre uma das formas de garantia das operações realizadas no âmbito do Sistema de Financiamento Imobiliário (art. 17).

A sua constituição é realizada por meio do registro do instrumento que lhe serve de título perante o competente cartório de registro de imóveis, nos termos do art. 23 da Lei 9.514/97, oportunidade em que “o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel da coisa imóvel”.

Já com referência à alienação fiduciária sobre coisas fungíveis e a cessão fiduciária sobre recebíveis e/ou direitos creditórios, observa-se o regramento estabelecido na Lei ederal n.4.728/65 (Mercado Financeiro e de Capitais), alterada pela Lei Federal n.10.931/2014.

Em relação à cessão fiduciária sobre recebíveis e/ou direitos creditórios, passou a ser utilizada para a garantia das operações financeiras por ser vantajosa ao credor, uma vez que não precisa notificar o devedor para ter sua eficácia declarada (como é exigido no penhor).

Na oportunidade da contratação do mútuo financeiro, o cedente constitui a garantia, transferindo fiduciariamente a titularidade dos créditos que detêm sobre recebíveis ou outros direitos, em favor do cessionário, que passa a receber os valores diretamente dos devedores do fiduciante, os quais serão utilizados para amortização da dívida contratada, conforme estabelecem os art. 66- B, § 3.º da Lei 4.728/65 c/c art. 18 da 9.514/97.

Oportuno observar que no art. 42 da Lei Federal n.10.931/2004, foi inserida a exigência do registro do contrato como condição, apenas e tão somente, para que seja eficaz contra terceiros:

Assim, diferentemente do que ocorre com a alienação fiduciária, na garantia prestada sobre cessão fiduciária, não existe a figura do registro como elemento que constitui a titularidade o credor, o fiduciário.

A CESSÃO FIDUCIÁRIA NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

A cessão fiduciária de créditos e títulos de crédito constitui negócio jurídico para garantia, que se divide em duas naturezas: a) uma obrigacional, que consiste no dever de pagamento do crédito obtido por meio de mútuo; b) outra real, que consiste na cessão/transferência do direito de crédito em favor do credor fiduciário, que ostenta a posição de proprietário até que durante o período de adimplemento do contrato firmado entre as partes, vez que ocorrido o inadimplemento, o direito cedido consolida-se em favor do referido credor.

Analisando esta garantia no âmbito da Lei de Falência e Recuperação Judicial – Lei 11.101/2005, verifica-se que a cessão fiduciária de crédito foi por longo período objeto de questionamento acerca da sua sujeição ou não ao procedimento

recuperacional, assim como, se teria a classificação de extraconcursal, e mais, ocorriam divergências de entendimento na doutrina e na jurisprudência quanto a obrigatoriedade, ou não, do registro em cartório.

Para excluir qualquer dúvida acerca da condição de extraconcursal do crédito garantido pela cessão fiduciária, destaca-se que o art. 66-B, § 3.º da Lei Federal n.º 4728/95 (introduzido pela Lei Federal n.º 10.931/2004) admitiu como garantia fiduciária as espécies alienação e cessão ao referir-se a elas genericamente como propriedade fiduciária.

Assim, se a legislação especial estabelece a existência e pertinência das referidas espécies, não há como ignorar que a Lei 11.101/2005 também as contempla no seu art. 49, § 3.º da Lei 11.1011/2005.

Oportuno destacar que o tratamento dispensado ao crédito garantido por cessão fiduciária distingue-se daquele aplicado à alienação fiduciária.

Na cessão fiduciária a constituição da garantia opera-se na contratação da operação financeira, dispensando-se, portanto, o registro, para que o negócio fiduciário tenha validade entre as partes, conforme estabelece o art. 42 da Lei 10.931/2004.

A JURISPRUDÊNCIA DO STJ

O Superior Tribunal de Justiça, em decisão da sua Segunda Seção Cível, pacificou divergências nas decisões dos tribunais e entre suas próprias turmas, ao definir que a cessão fiduciária de título de crédito, nos termos da disciplina específica da Lei 4.728/1965, com a redação dada pela Lei 10.931/2004, não depende de registro em cartório de títulos e documentos para ser constituída a garantia, não se lhe aplicando a regra do CCB/2002, art. 1.361, § 1º, regente da cessão fiduciária de coisa móvel infungível.

Definiu o STJ, que é posição daquele eg. Tribunal Superior a impossibilidade de se impor restrições à propriedade fiduciária de crédito, por não se tratar de bem de capital, destacando como Precedente no STJ o julgamento do AgInt no REsp. 1.475.258-MS, em que foi Relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, publicado no DJe.20.2.2017.

Ressaltou a Corte Superior que o registro da cessão fiduciária do título de crédito será necessário apenas para salvaguardar eventual direito de terceiro a quem o título de crédito seja oponível, a saber, o devedor do título de crédito cedido pela recuperanda.

E mais, firmou a recente decisão do STJ que, não havendo repercussão na esfera de direitos dos demais credores, há irrelevância da existência do registro para o processo de Recuperação Judicial.

Ainda, segundo a jurisprudência pacífica do STJ, por força da Lei de Falência e Recuperação Judicial – Lei 11.101/2005, em seu art. 49, § 3º, não se submetem à recuperação judicial os créditos garantidos por cessão fiduciária.

A pacificação do tema foi definida pelo Superior Tribunal de Justiça no recente julgamento do Recurso Especial – REsp. 1.629.470/MS, em 30/11/2021, em decisão da sua Segunda Seção Cível, em que foi Relatora a Ministra Maria Isabel Gallotti, decisão publicada no DJe.17/12/2021.

Como visto, a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça veio dirimir dúvidas de interpretação e pacificar a matéria em sede do Poder Judiciário, o que traz segurança as empresas que operam o crédito garantido por cessão fiduciária.

Jurandyr Souza Junior Consultor Jurídico da ACREF PR e SINFAC PR.

Advogado – OAB/PR 76683 – 1ª.OAB/PR 8.491

sócio de PENNACCHI SOUZA Sociedade de Advogados – OAB/PR 5952

* A propriedade fiduciária e a extraconcursalidade na recuperação judicial – OAB Campinas

* publicado em 28/01/2022 -JuruáDocs Notícias Jurídicas

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