Michele Tatiane Souto Costa Marques
OAB/PR 36.583
Sócia da banca Thierry Phillipe Souto Costa Advocacia Empresarial
12 de maio de 2020
A partir do decreto federal que decretou estado de calamidade pública no país (DL nº 06/2020), decorrência do crescente número de casos de coronavirus (Covid-19) e a indicação por diversos órgãos governamentais e da Organização Mundial da Saúde, do isolamento social como forma eficaz de prevenção da doença, foram tambem editados inúmeros outros decretos impondo a paralisação das atividades do comércio e indústria (salvo os de caráter essencial) e buscando tambem regulamentar as consequências desta paralisação, gerando efeitos econômicos de grande impacto.
Os primeiros efeitos econômicos decorrentes do distanciamento social e fechamento dos estabelecimentos comerciais foram rapidamente percebidos, tais como a paralisação de contratos de trabalho e demissões, mas tambem ante suspensão e cancelamento de inúmeros pedidos junto à industrias de todos os gêneros, com raras exceções como a indústria alimentícia e de itens de higiene, limpeza e bens ligados à saúde.
Ademais, como consequências imediatas decorrentes desta paralisação da atividade industrial e varejista, tivemos o aumento significativo da inadimplência, inclusive daqueles sacados que sempre apresentaram boa liquidez de seus recebíveis, bem como uma inevitável retração das atividades de fomento comercial, sejam fomentos mercantis, securitizadoras e |Fundos de Investimentos, que colocaram o pé no freio em suas atividades até que consigam contabilizar o volume de recebíveis inadimplidos e busquem renegociar com cedentes e sacados.
Não obstante, o isolamento social se estende por período demasiado longo e sem previsão de cessar a curto prazo, dificultando ainda mais a retomada da economia e a geração de atividade industrial, fazendo com que a capacidade de liquidez permaneça reduzida e que a inadimplência seja uma realidade cada vez mais corriqueira.
Importante esclarecer que a inadimplência no fomento comercial deve e ser dividida pela linha de corte do decreto que estabeleceu calamidade pulica, sendo que aquelas inadimplências já anteriores ao decreto de calamidade pública podem ser tratadas de forma diversa daquelas geradas em decorrência da paralisação da economia, ainda que venham a ser negociadas em conjunto.
Nesse sentido, são várias as maneiras possíveis de se implementar um bom sistema de cobrança e renegociação e, em qualquer delas, é primordial a assessoria jurídica especializada, seja na busca de informações prévias sobre sacados e cedentes, seja na formalização de documentos hábeis a trazer segurança jurídica na renegociação.
Além disso, a formalização de bons contratos, sejam de confissão de dívida, com ou sem garantias pessoais, reais ou fiduciárias, dação em pagamento, recompras, pagamento por terceiros ou qualquer outra forma de negociação é de extrema importância para conferir executividade ao documento, bem como a formalização rápida dos registros em eventuais garantias para conferir preferência ao crédito novado.
Inclusive poderão constar nos referidos documentos inúmeras situações que, mediante acordo entre as partes, conferem maior rapidez na execução em caso de inadimplência. São os chamados negócios jurídicos processuais, previsto no artigo 190 do novo Código de processo Civil, cuja aplicação nos contratos empresariais é de extrema relevância e talvez a principal delas seja a possibilidade de as partes negociarem previamente regras que orientarão eventual processo judicial.
Ponto importante a ser tambem lembrado quanto à inadimplência crescente é a tramitação do PL 1.397/20 que, em caráter extraordinário institui medidas destinadas a prevenir a crise econômico-financeira do agente econômico, seja ele pessoa natural ou jurídica que exerça ou tenha por objeto o exercício de atividade econômica em nome próprio, independentemente de inscrição ou da natureza empresária de sua atividade.
Dentre essas medidas está a suspensão por 60 (sessenta) dias de cobranças extrajudicial ou judicial de dívidas vencidas após a decretação do estado de calamidade (20/3/20) e a negociação preventiva coletiva.
Desse modo, cabe enaltecer que, no atual momento, de absoluta incerteza e insegurança jurídica quanto ao que o futuro reserva para a sobrevivência das empresas e para os credores, deve-se priorizar às negociações, porém sem esquecer de buscar maior segurança jurídica e efetividade do recebimento.